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Blog Padre F�bio de Melo     4/3/2006  
 
 
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CORA��O DE PADRE, CIDADE DO POVO.  por pe f�bio de melo, scj. 4/3/2006 as 12:41
Pessoas s�o como cidades. Um conjunto arquitet�nico de vielas e avenidas, cruzamentos e sem�foros, reservas onde �rvores disfar�am a dureza do concreto, cemit�rios onde os mortos s�o deixados, na esperan�a de que a ressurrei��o os recolha ao cair da tarde. Tudo isso comp�e a cidade que somos. A pra�a principal, o coreto da matriz, as ruas estreitas com suas casas antigas e os lugares ermos onde ainda sobrevivem goiabeiras t�o cheias de inf�ncia. Minha vida � meu leme neste oceano t�o cheio de portos e partidas.
Fico pensando nos que passam por mim. Os que visitam a minha cidade interior. N�o sei por onde entram. Se pelo p�rtico principal, ou pelo cemit�rio. N�o sei. O que sei � que nesse constante ir e vir, o rosto an�nimo insiste em permanecer vivo na retina de minhas saudades. A senhora idosa, espremida na multid�o, sorriso envelhecido, mas t�o cheio de uma for�a misteriosa, repete a melodia de minhas palavras, canta comigo em p�blico o que um dia foi s� meu. Ela me v� de longe, e eu a vejo t�o perto. O rapaz t�mido, m�quina fotogr�fica nas m�os, querendo pedir o pedido mais simples, o mais corriqueiro, mas que para ele � exerc�cio grandioso de acertar o Davi interior e vencer o Golias do medo. Posso tirar uma foto com voc�, padre? A frase sai, o medo n�o. A vida de algu�m que um dia lhe acompanhou uma dor solit�ria, agora ali, registrada na fotografia que ele guardar� com carinho. Eu tamb�m gostaria de tirar uma foto com tanta gente! Pessoas que escrevem aqui, e que nunca vi o rosto. Pessoas que deixam recados, insistem em acenar um len�o branco de paz, desejosas de que um dia a gente pudesse passar horas e horas falando de como nascem as m�sicas e de como � do�do ser gente nos dias de hoje. Gente que me receberia na cozinha de sua casa e que repartiria comigo a intimidade de sua vida familiar. Pessoas que eu amaria com profundidade, que eu seria capaz de dar a minha vida por elas, mas que eu n�o tenho tempo para conhecer.
� vida que n�o tem conserto! Quanta pressa h� nesses intervalos entre chegadas e partidas! Quantos bilhetes a�reos voados, quantas passagens de �nibus cumpridas, acumuladas num lugar da minha cidade que n�o sei onde fica. Vida perdida nas entrelinhas das palavras, do olhar distante que me olha querendo chegar, do cora��o que deseja despejar os pecados nas minhas m�os para que eu os devolva revestidos da luz que s� a miseric�rdia de Deus possui. Quantos olhares perdidos, querendo conselhos, dire��o espiritual. Quantos bra�os querendo abra�o, e que eu, pelo limite do corpo n�o alcan�o. Emails deixados na caixa, a esperan�a de respond�-los, pedidos de socorro, turistas querendo visitar minha cidade. Alguns retirando as sand�lias dos p�s porque acreditam na sacralidade do meu solo, enquanto outros desejam apenas sujar minhas pra�as. N�o h� muros na minha cidade. Apenas pe�o ajuda aos que me amam de verdade. Velem comigo, velem por mim. Sou um prefeito ausente...
Os poetas n�o s�o bons administradores. Precisam de mil assessores. Cidade de poeta corre o risco de ser um caos. � por isso que quero ser um poeta possu�do pelo c�u. Quero a aud�cia de poder dizer que sou seu, sem que isso venha ferir minha castidade. Quero ser do povo, quero ser de Deus. Quero misturar meu sangue no sangue dos inocentes, mas n�o quero temer tocar no sangue dos culpados.
Eu quero a vida. A mais mi�da, a de toda hora. A vida de cada instante. O instante de cada vida. Eu quero o sopro em dias quentes. Eu quero o riso sem alarde. Eu quero a minha cidade de portas abertas. Venha de onde vier, mas venha. H� sempre um quarto preparado para quem n�o tem onde dormir. H� sempre uma mesa posta, ainda que na madrugada. Venha de onde vier, mas venha. Minha cidade n�o tem muros, n�o tem portas. Venha quando quiser, venha quando precisar, porque num cora��o de padre, quem manda � o povo!